Moura Ramos Indústria Gráfica: livros, revistas, embalagens, sacolas, agendas e impressos em geral.: 08 de Dezembro - Dia do Cronista Esportivo

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

08 de Dezembro - Dia do Cronista Esportivo

A crônica esportiva no Brasil

Podemos hoje enquadrar a crônica como um gênero jornalístico-literário de assunto livre, que registra pequenos fatos do cotidiano sobre política, arte, esporte, entre vários outros temas. Por tratar de assuntos considerados menos importantes e por ser um texto limitado espacialmente nas edições dos jornais nas colunas ou em artigos opinativos, a crônica é tida como um gênero menor, o que, talvez, seja essa característica que permita ao cronista analisar as pequenas coisas que as grandes vistas não percebem (LUCENA, 2003, p. 162). 

A crônica tal como a conhecemos hoje no Brasil, nasceu nos rodapés dos jornais franceses do século XIX com o objetivo de entreter os leitores. Nestes espaços, começaram a aparecer textos que diferiam do caráter jornalístico do contéudo editorial. Eram os chamados folhetim-romance e folhetim-variedades. O folhetim romance eram textos ficcionais desenvolvidos em capítulos, o que permitia que o leitor acompanhasse a história dia a dia pelos jornais. Já o folhetim variedades comentava fatos do cotidiano, dando liberdade ao autor de construir diálogos, acrescentar personagens, além de se exprimir em uma linguagem mais livre que o restante da edição. Foi o este último que deu origem a crônica.

No Brasil, sobretudo a partir do final do século XIX, o gênero foi ganhando uma nova roupagem, a ponto do professor e crítico literário Moisés Massaud afirmar que criamos uma outra forma textual. Para ele:

[...] a crônica assumiu entre nós caráter sui generis. Em outros termos, estamos criando uma nova forma de crônica (ou dando erradamente esse rótulo a um gênero novo) que nunca medrou na França. Crônica é para nós hoje, na maioria dos casos, prosa poemática, humor lírico, fantasia, etc. [...] (MOISÉS, 1982, p. 246).

Ao longo de todo século XX, a crônica brasileira se firmou e se afirmou como gênero, estabelecendo uma tradição de bons autores, muitos deles pertencentes ao cânone literário nacional como Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, José Lins do Rêgo, Clarice Lispector, entre outros.

Mário Filho, o inventor do futebol brasileiro

O futebol é visto como um dos principais símbolos da chamada identidade brasileira . No entanto, tal construção identitária é relativamente recente na história cultural do Brasil. Seu marco cronológico inicial ocorre na década de 1930, momento em que o esporte se torna profissional no país, graças à popularização promovida de forma determinante pelo jornalismo, através da mediação das transmissões dos jogos pelo rádio e do aumento de espaço nas editorias dos jornais impressos.

Nesse movimento de crescimento da presença do futebol na imprensa brasileira, um nome contribuiu de maneira crucial: Mário Rodrigues Filho. Sua atuação na promoção de competições, eventos, notícias e fatos, em suma, do próprio espetáculo futebolístico, foi de fundamental importância para tornar o esporte popular entre nós.

Nascido no Recife em 1908, Mário Filho se transferiu para o Rio de Janeiro ainda durante a infância. Em 1926, na adolescência, iniciou a carreira jornalística ao lado do pai, Mário Rodrigues, então proprietário do jornal A Manhã, como repórter esportivo, um ramo do jornalismo ainda inexplorado. Como era um entusiasta do futebol, já neste primeiro trabalho Mário Filho dedicou páginas inteiras à cobertura das partidas dos times cariocas. No Crítica, segundo jornal de propriedade de seu pai, Mário revolucionou o modo como a imprensa mostrava os jogadores e descrevia as partidas, adotando uma abordagem mais direta e livre de rebuscamentos, inspirado no linguajar dos torcedores.

Foi desta época a popularização da expressão "Fla-Flu", que muitos consideram ter sido criada pelo próprio Mário. Após a morte de seu pai e o fim do Crítica (que dirigiu por poucos meses) em 1931, Mário fundou aquele que é considerado o primeiro jornal inteiramente dedicado ao esporte em todo o mundo, O Mundo Sportivo, de curta existência. No mesmo ano passou a trabalhar no jornal O Globo, ao lado de Roberto Marinho, seu companheiro em partidas de sinuca. Neste novo emprego, levou a mesma forma de escrever inaugurada no Crítica, um estilo que foi fundamental para tornar o futebol - então uma atividade da elite - um esporte de massas.

Em 1936, Mário comprou de Roberto Marinho o Jornal dos Sports, publicação em que criou os Jogos da Primavera em 1947, os Jogos Infantis em 1951, o Torneio de Pelada no Aterro do Flamengo e o Torneio Rio-São Paulo. No final dos anos 40, o jornalista lutou pela imprensa contra o então vereador Carlos Lacerda, que desejava a construção de um estádio municipal em Jacarepaguá, para a realização da Copa do Mundo de 1950. Mário conseguiu convencer a opinião pública carioca de que o melhor lugar para o novo estádio seria no terreno do antigo Derby Clube, no bairro do Maracanã, e que o estádio deveria ser o maior do mundo, com capacidade para mais de 150 mil torcedores.

Considerado o maior jornalista esportivo brasileiro de todos os tempos, Mário faleceu de um ataque cardíaco, aos 58 anos. Em sua homenagem, o antigo Estádio Municipal do Maracanã ganhou o seu nome. Em paralelo a popularização do futebol, o trabalho de Mário Filho promoveu a valorização do métier do analista e do repórter esportivo. Para o também cronista e dramaturgo Nelson Rodrigues, seu irmão, foi Mário quem inventou a crônica esportiva brasileira, dando-lhe uma linguagem própria que aproximou, através da palavra, o futebol do povo. Sobre isto, ele colocou:

Mario Filho inventou uma nova distância entre o futebol e o público. Graças a ele, o leitor tornou-se tão próximo, tão íntimo do fato. E, nas reportagens seguintes, iria enriquecer o vocabulário da crônica de uma gíria irresistível. E, então, o futebol invadiu o recinto sagrado da primeira página [...]. Tudo mudou, tudo: títulos, subtítulos, legendas, clichês [...]. O cronista esportivo começou a mudar até ûsicamente. Por outro lado, seus ternos, gravatas e sapatos acompanharam a fulminante ascensão social e econômica. Sim, fomos proûssionalizados por Mario Filho (RODRIGUES apud MARON FILHO; FERREIRA (orgs.), 1987, p. 137-138 ).

O futebol entre a paixão e a razão

A partir da década de 1950, quando finalmente a polêmica sobre se o futebol seria ou não parte constitutiva da cultura nacional foi apaziguada no meio intelectual, a crônica esportiva ganhou prestígio no país, sobretudo por intermédio dos textos de autores como o próprio Mário Filho, o citado Nelson Rodrigues e José Lins do Rego.

No entanto, neste mesmo período, uma cisão de caráter estilístico veio à tona em relação ao gênero, uma querela entre os racionalistas, que preferiam escrever sobre a parte técnico/tática da modalidade, e os apaixonados, mais preocupados com os aspectos sociais ligados ao esporte do que com a partida propriamente dita. Podemos afirmar que um dos grandes motivos, senão o maior, desta cisão foi de ordem tecnológica. Foi na década de 50 que a televisão foi introduzida no Brasil, não tardando em utilizar o recurso do videoteipe.

Até então, a crônica esportiva brasileira, como nos casos dos textos dos cronistas citados, era, conforme a tipologia descrita acima, apaixonada. Livres do registro da imagem, os autores usavam a imaginação e estimulavam as dos leitores, discorrendo sobre fatos curiosos (e muitas vezes líricos) que ocorriam nas partidas e, sobretudo, nos seus entornos (vida social, torcida, arredores dos estádios etc.). A própria falta de uma estrutura profissional mais sólida na imprensa esportiva do país permitia ao cronista a liberdade de criar textos mais fantasiosos, inventando, em algumas ocasiões, situações ficcionais, sem que pudesse ser desmentido por gravações televisivas.

O advento da televisão trouxe uma maior profissionalização do jornalismo esportivo. Com ela, o público passou a ter acesso as transmissões de jogos, programas esportivos, mesas-redondas com participações de especialistas, uso do videoteipe, entre outros recursos. Tudo isso terminou por influenciar a crônica futebolística que foi perdendo seus enredos imaginativos, cedendo espaço para análises mais técnicas dos jogos.

Mais novo que Mário Filho e José Lins do Rêgo, Nelson Rodrigues foi o cronista que mais intensamente viveu esta mudança estilística da crônica esportiva nacional, sendo o mais emblemático naquele momento. Isto porque, com o estabelecimento da televisão, Nelson, com seu estilo passional e de pendor dramático, teve em várias ocasiões suas crônicas questionadas por outros cronistas que divergiam dos seus posicionamentos pautados nas imagens para esses criou a expressão idiotas da objetividade , que terminou sendo recorrente em seus textos.

Para o autor, as transformações trazidas pelos novos meios tecnológicos tolhiam a imaginação. Foi por acreditar nisso que cunhou a frase: O videoteipe é burro , também bastante repetida em suas declarações. Cabe aqui ressaltar, no entanto, que esta tipologia entre cronistas apaixonados e racionalistas não se deu de forma tão categórica, tendo em vista que vários autores não permaneceram no rígido limite imposto por ela. Neste sentido, André Mendes Capraro, na sua tese Identidades imaginadas: futebol e nação nas crônicas esportivas brasileiras do século XX, faz a seguinte colocação:

(...) mesmo que permaneçam dentro dos limites de um tipo de crônica, muitos podem alterar sua forma de abordagem textual exatamente para escapar do convencional, buscando a adesão do público leitor que, no decorrer de décadas, ganhou um repertório cada vez maior de crônicas e escritores nos periódicos brasileiros (...) (CAPRARO, 2007, pág. 47).

Porém, mesmo concordando com Capraro, ao longo de toda segunda metade do século XX e até o momento atual, esse conflito se faz presente, caracterizando a escrita dos cronistas esportivos nacionais. Mesmo flertando entre um estilo e outro, não é difícil para nós percebermos as tendências dos escritores perante a categorização da tipologia descrita acima. Apenas a título de ilustração, entre os autores que escrevem hoje na imprensa brasileira, podemos considerar mais racionalistas os textos de Tostão, Fernando Calazans e Lédio Carmona, por exemplo; com viés mais apaixonado, temos as crônicas de Armando Nogueira, Luís Fernando Veríssimo, José Geraldo Couto, Xico Sá, entre outros autores.

A Web 2.0 e o Jornalismo Participativo

Como acabo mostrar, a televisão teve uma influência fundamental no aspecto estilístico da crônica esportiva brasileira. Nas duas últimas décadas, estamos vivenciando uma outra revolução comunicacional com o surgimento e o rápido desenvovimento das chamadas novas tecnologias de informação e comunicação (TICs).

No campo do jornalismo, é bastante perceptível uma mudança de panorama, tanto no que diz respeito à produção como ao consumo, com a chegada da rede mundial de computadores, a mais representativa e importante dessas novas tecnologias. Um panorama que vem alterando - e deve se alterar ainda mais - com o advento da chamada Web 2.0.

A expressão Web 2.0 foi empregada em público pela primeira vez no ano de 2004, como nome de uma série de conferências sobre o tema realizadas pela editora O'Reilly Media1 e pela Media Live International, empresa promotora de eventos naárea de tecnologia. Desde então, ela vem se popularizando de forma avassaladora.2 Web 2.0 é um termo que se refere à segunda geração de serviços e aplicativos da Internet e aos recursos, tecnologias e conceitos que permitem um maior grau de interatividade e colaboração na utilização da rede mundial de computadores.

Tim O'Reilly, fundador da O'Reilly Media, a define de forma sucinta e paradigmática:

Web 2.0 é a mudança para uma internet como plataforma, e um entendimento das regras para obter sucesso nesta nova plataforma. Entre outras, a regra mais importante é desenvolver aplicativos que aproveitem os efeitos de rede para se tornarem melhores quanto mais são usados pelas pessoas, aproveitando a inteligência coletiva.

Baseado nesta ideia de inteligência coletiva , sua maior revolução vem sendo, sem dúvida, possibilitar uma efetiva participação dos usuários na criação de conteúdos produzidos livremente na Internet, sem a chancela de uma instituição ou mesmo de um suporte de técnicas jornalísticas de apuração. Com a Web 2.0, a rede ganhou caráter ainda mais social, integrando os indivíduos no processo de geração, distribuição e organização da informação, e possibilitando a interação entre eles na disseminação de seus conhecimentos. No Brasil, por exemplo, segundo a F/Radar, pesquisa realizada pelo instituto DataFolha a pedido da F/Nazca, 53% dos que acessam a Internet já incluíram ou incluem textos e/ou informações de sua autoria no ciberespaço.

A popularização da Web 2.0 vem trazendo mudanças nas empresas e práticas jornalísticas da Internet. O envolvimento de cidadãos comuns, antes considerados meros leitores, na publicação e edição de conteúdos dos veículos comunicacionais, é uma prática cada vez mais corrente. Esta tendência é chamada de Jornalismo Participativo, Jornalismo Cidadão, Jornalismo Open-Source ou mesmo Jornalismo 2.0.

A crônica esportiva em tempos de jornalismo participativo

Como o jornalismo participativo é um fenômeno muito recente, ainda é difícil avaliar do ponto de vista estilístico como ele vem afetando a crônica esportiva brasileira - este é um dos pontos que pretendo investigar no futuro de minha pesquisa. No entanto, uma característica que se apresenta de imediato com esta nova tendência jornalística é a democratização da produção textual. A cada dia cresce o número de pessoas que, independente de estarem ligados ou não a algum órgão da imprensa, escrevem matérias, reportagens, crônicas, enfim, toda sorte de textos jornalísticos para serem publicados na Internet. No caso específico da crônica esportiva brasileira, a quantidade de cronistas profissionais, amadores, torcedores de clubes, amantes do esporte etc., que escrevem em sites e blogs, sejam eles dos grandes veículos de comunicação, das agremiações oficiais ou não -, ou mesmo pessoais, sobre futebol já salta aos olhos.

Fonte: www.cencib.org

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